(À esquerda, o compositor Xandinho, junto com Daniel Collete)
Começar com o pé direito, esse é o propósito desse blog que, visa, acima de tudo, identificar as raízes do samba-enredo e mostrar os preparativos das escolas de samba para o maior espetáculo da Terra: o Carnaval.
E o nosso primeiro entrevistado vem do Rio de Janeiro.Daniel Collete, intérprete da escola de samba Dragões da Real, que integra o Grupo de Acesso do carnaval paulistano é considerado como um dos melhores da atualidade. Já defendeu escolas do Rio do Janeiro, como Beija-Flor de Nilópolis e, em São Paulo, já atuou em escolas de como X-9 Paulistana e Mocidade Alegre.
Sua carreira no samba, deu inicio em Nilópolis, município de 400 km quadrado que Collete nasceu, por esse motivo, era inevitável o sambista não entrar para esse mundo, que tem como principais referências os sambistas Cabana e Martinho da Vila, que foi padrinho da bateria mirim da Beija-Flor quando Daniel fazia parte do quadro.
Para ele, o samba-enredo, dentro de uma agremiação, tem o peso de 70% para a construção do espetáculo: "Ah, é, pode “botar” que “é” 70%. Não só começa o samba-enredo. Ele começa na escolha do tema, assim, a feitura da sinopse, que tem que ser uma sinopse acessível ao compositor, para que ele possa construir uma boa obra. E todo esse caminhar, aí, são 70% para que a escola possa cantar bem na Avenida e tirar boas notas", diz o sambista.
Confira, abaixo, na íntegra, algumas perguntas que o Vozes do Carnaval elabaorou para o consagrado Daniel Collete:
O samba-enredo está passando por uma crise, devido o mercado fonográfico?
Ó, cara. Não só o samba, mas eu acredito que no geral. Mas, eu acredito que a maior crise que o samba passa não é só o lance do fonográfico e, sim, da comercialização do samba. Eu vou te explicar como! As escolas, hoje, procuram fazer enredos que possam angariar fundos, enredo que tenha patrocínio e, com isso, fica presa a muita coisa que tem que fazer uma coisa comercial, que tenha que fazer uma coisa que esteja no contrato e que tenha que mostrar pra escola. Então, fica muito comprometido até chegar para se fazer o samba e levar pra Avenida. Então, a espontaneidade, a alegria, aquilo tudo natural fica um pouco comprometido pra quando chega à Avenida.
Você acredita que o carnaval de São Paulo esteja carente de algo?
Olha, cara, carente de organização, assim: é lamentável o lance que tem Liga e Super Liga. Cada um tem o seu lado, cada um tem o seu motivo, mas eu acho que antes de qualquer coisa, todos deviam pensar no total, no carnaval de São Paulo, que parece que tem dois ou três anos que existe Super Liga. Se eles forem analisar bem, já há dez anos, esses três anos “demorou”, o nosso carnaval demorou há crescer dez anos, entendeu? É um retardo de dez anos. Podia “tá” muito mais longe, se você for fazer uma comparação com a década de 80, 90, está maravilhoso, mas podia “tá” muito maior se não houvesse essa divisão e esses interesses individuais, que é um grande problema.
Dentre os presidentes que já passaram pela Liga de São Paulo, em sua opinião, teve algum que cravou seu nome dentro do samba paulistano?
Olha, cara, eu acho assim: até com os defeitos, eu acho que todos foram de suma importância. Por quê? Porque não se vive só de resultados positivos, não é? Na vida, a gente tem, em cima dos erros, se obter grandes vitórias. Então, na vida, nada melhor do que transferir isso pra esse lance do governamento do nosso samba. Erraram, acertaram e, assim, o carnaval vai crescendo.
O que representa uma fase de eliminatória de samba-enredo?
Cara, eu sou da época que essa festa, aí, é a maior festa de uma escola de samba, onde todo mundo se reuni, pessoas que se conhecem, ou não se conhecem, pessoas que participam da escola, pessoas que não participam, é uma grande reunião. Os rivais se confraternizam, brincam. A gente encontra todos os colegas intérpretes, colegas compositores. Obvio, natural, que só vai um para Avenida, aí, chega lá no palco, todo mundo fica de boa, mas é a maior festa que tem numa escola de samba.
(À esquerda, o compositor Xandinho, junto com Daniel Collete e filhos, o intérprete Edson Liz )
Por que muitos intérpretes defendem seus sambas em diversas escolas, nos dias atuais?
Não, não é atual não, já faz algum tempo! Por exemplo: você é compositor de um samba e tem dez sambas, vinte sambas concorrendo, cada um quer fazer o melhor, quer o seu samba melhor interpretado. O que eles fazem? Contratam intérpretes para virem defender o samba da melhor forma possível, colocar uma boa cara, uma boa apresentação, como se fosse uma vitrine. Na vitrine, você usa de várias marcas de roupa pra poder colocar uma vitrine bonita. É a mesma coisa com o samba-enredo! Pra colocar um negócio legal, aflorado, bonito pra que possa funcionar.
Qual escola de samba, em São Paulo, você se identifica mais?
Cara, eu cheguei aqui (SP) em 1996, cheguei, aqui, pra X-9 Paulistana, pelo qual eu tenho um grande carinho, pelo qual eu fazia parte até esse ano de 2010 e agora me transferi para a Dragões da Real. Eu tenho um grande carinho pela X-9, um grande carinho pelo povo da Mocidade Alegre, aquele som é maravilhoso, crescemos juntos e tenho um carinho enorme pela Dragões da Real, que é uma escola que tem dez anos e eu os ajudo desde 2004, quer dizer, nós nos ajudamos desde 2004. E tenho um carinho pelo samba de São Paulo total. Pra você ter ideia, alguns dias atrás, eu fui à primeira vez no Vai-Vai. Eu nunca tinha ido disputar um samba-enredo lá. É uma coisa impressionante, uma energia que tem lá, eu fiquei arrepiado com toda aquela energia, lá. Então, quer dizer, cada dia que passa, a gente toma carinho por mais escolas, porque cada uma tem uma identidade legal.
(Daniel Collete e intépretes na disputa do samba-enredo, na fase semi-final, na escola de samba Acadêmicos do Tucuruvi)
Existe alguma receita para se manter com o sucesso?
Ah, rapaz! O sucesso não “é” nós... É o pessoal que acha. Porque é assim, o samba é arte popular e a gente não é bom sozinho. Eu sou um pobre, tem sempre um time atrás de mim, sempre tem o povo da escola, obvio, natural, que a gente lida na frente com o microfone da escola, a gente vê um povo à frente que está maravilhoso, aquela energia, a gente troca energia e acaba saindo as mirabolantes, as loucuras que a gente faz e acaba correspondendo e todo mundo gosto. Mas, o sucesso é o povo, todo mundo junto. O samba é arte popular.